Leishmaniose tegumentar está se tornando uma doença urbana

Rodrigo Sala Ferro, médico infectologista, autor da pesquisa | Foto: Homero Ferreira

Realizado por médico infectologista e orientado por outro médico da mesma especialidade de doenças infecciosas, estudo científico sobre leishmaniose tegumentar apresenta resultados que chamam a atenção para políticas públicas que contemplem serviço de vigilância ativo, diagnóstico precoce dos pacientes, tratamento efetivo e atividades de educação em saúde. Ações voltadas à conscientização da população e dos profissionais de saúde para a enfermidade mundialmente considerada como a mais negligenciada, como vem ocorrendo no oeste paulista, ao ponto de se tornar uma doença urbana; conforme constatação no Pontal do Paranapanema.

A hipótese de urbanização da doença foi comprovada em Teodoro Sampaio que junto com Presidente Prudente são as cidades com maior prevalência, conforme a pesquisa do doutorado de Rodrigo Sala Ferro, orientada pelo Dr. Luiz Euribel Prestes Carneiro; desenvolvida no Programa de Pós-graduação em Meio Ambiente e Desenvolvimento Regional, pelo qual a Unoeste oferta mestrado e doutorado. O tipo de leishmaniose estudado possui negligenciamento extremo, ao ponto de ser a mais negligenciada das doenças negligenciadas, que são causadas por agentes infecciosos ou parasitas e consideradas endêmicas em populações de baixa renda, com baixos investimentos em pesquisas e pouca produção de medicamentos novos.

Espalhamento começou em 1905

Conforme consta da tese examinada e aprovada em banca de defesa pública na segunda-feira (23), resultando a Rodrigo a concessão do título de doutor, a leishmaniose tegumentar é caracterizada por ser doença infecciosa de pele, que não é contagiosa, mas de grande importância epidemiológica, devido suas diferentes formas clínicas, diversidade de parasitas causadores da doença, grande número de reservatórios (animais silvestres ou domésticos capazes de abrigar o parasita) e uma infinidade de vetores (mosquito palha) responsáveis por picar os animais e depois o homem, mantendo o ciclo da doença.

Mosquito encontrado no interior de matas, beira de rios, ranchos e sítios onde existam pequenas matas. No estado de São Paulo, entre 1998 e 2018 foram notificados 10.403 pacientes com a doença, com maior número de casos no Vale do Ribeira e no oeste paulista, em especial no Pontal do Paranapanema. No oeste paulista a doença se espalhou a partir de 1905, quando da construção da FerroOeste  que passou pelo Parque Estadual Morro do Diabo, localizado no município de Teodoro Sampaio e que é a maior reserva de floresta tropical do estado fora da Mata Atlântica. Parque que sempre foi um grande reservatório de mosquitos infectados pelo parasita.

Apoio:


Medotologia com dados do Sinan

Pela grande proximidade do parque com a zona urbana de Teodoro, a hipótese é a de que o vetor da doença tenha se urbanizado e esteja vivendo agora na área urbana de Teodoro Sampaio. O objetivo do projeto foi avaliar a possível urbanização da leishmaniose tegumentar nas cidades de Teodoro Sampaio e Presidente Prudente, exatemente por serem as duas cidades com maior número de casos do oeste paulista. Foram levados em consideração seus aspectos clínicos e epidemiológicos entre 2003 e 2020.

 

Foto: CedidaRogério, Luiz Euribel, Lourdes, Rodrigo, Marcus e Maurício
Rogério, Luiz Euribel, Lourdes, Rodrigo, Marcus e Maurício

 

“Nas duas cidades foram feitas capturas de vetores pelo serviço de vigilância epidemiológica municipal e os dados sobre os pacientes foram obtidos no mesmo serviço e extraídos das fichas de notificação Sinan [Sistema de Informação de Agravos de Notificação]. Foram produzidos mapas temáticos com a distribuição espacial de vetores no oeste paulista e dos pacientes nas cidades de Presidente Prudente e Teodoro Sampaio”, explica o Dr. Euribel.

Orientação para a saúde pública

Entre 2003 e 2020, foram notificados 40 casos em Teodoro Sampaio e 25 casos em Presidente Prudente, onde a maioria (75,3%) foi do sexo masculino, a faixa etária mais acometida foi acima de 60 anos, com 35,3% dos casos com lesões acometendo principalmente face, braços e pernas. Em relação onde as pessoas se infectaram ou foram picadas pelo mosquito, 58,4% relataram terem sido no proprio município (autóctones) e 72,3% tinham a forma cutânea (infecção na pele) da doença.

“Em Teodoro Sampaio, na pesquisa entomológica, 98% dos flebotomíneos capturados foram de Lutzomyia longipalpis vetor causador da leishmaniose visceral, mas houve captura dos vetores Lutzomyia whitmani e Lutzomyia neivai transmissores da doença, o que comprova a hipótese de que em Teodoro Sampaio a doença está se tornando urbana. Em Presidente Prudente, não foram capturados vetores”, diz o orientador do estudo que serve de orientação para o serviço público de saúde.

Contribuição para a sociedade

Para o autor do estudo, a contribuição da pesquisa é a de servir para a implantação das devidas políticas públicas de saúde. “É muito gratificante como doutorando e como médico infectologista a realização de uma pesquisa que visa a observação do padrão dos casos de leishmaniose tegumentar nas duas cidades com mais casos registrados no Pontal do Paranapanema, pois esta pesquisa não é apenas uma tese de doutorado e sim uma fonte de dados sobre o perfil dos casos registrados, assim sendo uma contribuição para sociedade”, comenta.

O Dr. Rodrigo Sala Ferro é prudentino que fez o ensino médio no antigo Colégio Domus agora conhecido como Multiplus; fez a graduação, mestrado e doutorado na Unoeste; e residência em infectologia no Hospital Regional Dr. Domingos Leonardo Cerávolo. Seu estudo no doutorado foi co-orientado pelo Dr. Edilson Ferreira Flores, do Departamento de Estatística do campus da Unesp em Prudente; e a colaboração da estudante Karina Briguenti de Souza, inserida em iniciação científica, pela Faculdade de Medicina de Presidente Prudente (Famepp/Unoeste).

Além do orientador, Dr. Luiz Euribel Prestes Carneiro, a banca examinadora foi constituída pela Dra. Lourdes Aparecida Zampieri D’Andrea, do Instituto Adolfo Lutz em Presidente Prudente; Dr. Rogério Giuffrida e Dr. Marcus Vinicius Pimenta Rodrigues, ambos da Unoeste; e Dr. Mauricio Domingues Ferreira, do Hospital das Clínicas, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).

Fonte: UNOESTE – Homero Ferreira

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